ESPERANÇA: A Âncora da Alma (Hebreus 6.13-20)
Pr. Mário Saraiva1
Muito diferente de Friedrich Nietzsche, que afirmava que “a esperança é o pior dos males, pois prolonga o tormento do homem” (online), o escritor aos Hebreus a chama de a “âncora da alma” (6.19).
Wiersbe (2006, p.385) afirma que “a âncora era um símbolo bastante usado na Igreja primitiva. Foram encontradas pelo menos 66 figuras de âncoras em catacumbas”.
Epíteto, filósofo grego estoico, dizia que “não se deve prender o navio a uma só âncora nem a vida a uma só esperança” (apud WIERSBE, 2006, p.385). O nosso navio espiritual, porém, sempre estará bem seguro, na nossa única âncora, Jesus Cristo (I Timóteo 1.1).
“A esperança, como a âncora de um navio, contrapõe-se à tendência de se afastar, estabilizando a alma em todas as circunstâncias” (ARRINGTON & STRONSTAD, 2009, p.774).
Matthew Henry dizia que “estamos neste mundo como um navio no mar; propenso a ser lançado para cá e para lá, e em perigo de afundar. Os confortos, as expectativas, as virtudes e a felicidade são a carga preciosa com que esse barco está carregado. O céu é o porto para o qual navegamos. As tentações, perseguições e aflições que encontramos são os ventos e ondas que ameaçam o nosso barco de ir a pique” (2010, p.781).
Diante do exposto, analisemos um pouco mais esse assunto:
I – DEFINIÇÃO
1. Definição etimológica. No hebraico, temos os termos miqweh e tiqwah, que podem ser traduzidos por anelo, cordão, desejo, expectação, conforme Rute 1.12 e Josué 2.18-21 (SIQUEIRA, online). A expressão brasileira “fio de esperança” estaria de acordo com esse sentido. No grego, temos o termo elpís, cujo sentido é “o que não se vê, o futuro, expectativa favorável e confiante, conforme Romanos 8.24,25” (VINE et al, 2002, p.614,615).
2. Definição bíblico-teológica.
ANDRADE define esperança como “uma das virtudes cardeais da fé cristã, através da qual o crente é motivado a crer no impossível e a vislumbrar a intervenção divina nos momentos mais críticos da existência. É a certeza de se receber as promessas feitas por Deus através de Cristo Jesus. A esperança tem a fé por motivação; seu fundamento é o amor. A esperança jamais fenece, porque tem como aval a Palavra de Deus. Quando do arrebatamento da Igreja, porém, há de perder a sua utilidade, pois o que se espera já será abençoadíssima realidade, I Co 13” (1998, p.140).
II – A FALTA DE ESPERANÇA E SEUS MALES
Sem qualquer dúvida, a falta de esperança, de expectativa, de anelo por ver o bem, traz inúmeros males para o ser humano. Dentre eles, podemos citar:
1. Ansiedade e medo.
Ansiedade é “aflição, angústia, perturbação do espírito causada pela incerteza, relação com qualquer contexto de perigo etc.” (BVS, online). O medo, por sua vez, é o “estado afetivo suscitado pela consciência do perigo ou de algo que suscita essa consciência” (Oxford Languages, online). A falta de esperança gera tanto ansiedade quanto medo. É preciso superá-los (Salmo 34.4; Salmo 27.1-5; Mateus 6.25-34; Filipenses 4.6,7; I Pedro 5.7).
2. Depressão.
É a doença da alma, conhecida também como o mal do século XXI. No estado depressivo, “há presença de tristeza, pessimismo, baixa autoestima” (BVS, online). A raiz de toda depressão nada mais é que a falta de esperança. Precisamos cultivar em nosso coração a esperança bíblica cristocêntrica (I Pedro 1.3-9).
3. Murmuração e insensibilidade espiritual.
Quando a esperança foge, e passamos a olhar apenas para as circunstâncias, que muitas vezes se tornam adversas, somos tendentes a murmurar, a viver uma vida de queixumes, de lamentos (Números 14.29; Filipenses
1 Líder da Assembleia de Deus em Queimadas, Santa Helena (MA), membro do Conselho de Doutrinas da CEADEMA e da Comissão de Apologética, licenciado em Letras, especialista em Teologia, especialista em Hermenêutica e Mestre em Ciências Teológicas.
2.14,15). Como efeito colateral desse estado, nos tornamos insensíveis para a realidade espiritual, não progredimos na fé, ficamos estagnados, paralisados (Salmo 73).
4. Morte espiritual.
A morte espiritual pode ser entendida como o estado espiritual no qual se encontra aquele que não tem mais vida com Deus, que perdeu a comunhão com o Senhor. O mal último da falta de esperança é inevitavelmente esse terrível estado (Ezequiel 37.11).
Graças a Deus, o nosso Deus é o Deus da restauração (Ezequiel 37.12-14). Clamemos a Ele, busquemos ao Senhor!
III – VENCENDO A FALTA DE ESPERANÇA: aprendendo com Jeremias (Lamentações 3.18-32)
O livro de Lamentações é uma coleção de tristes canções fúnebres, com as quais Jeremias registrou, com vívidos detalhes, a destruição de Jerusalém e como seu povo foi saqueado. O pano de fundo histórico é o domínio do Império Babilônico na Judeia. Naquele contexto, o profeta estava sofrendo pressão de todos os lados para desanimar, para desistir. A própria vida de Jeremias como profeta, aos olhos humanos, tinha sido um fracasso: sua mensagem era rejeitada e ignorada, foi aprisionado pelos guardas do templo, usou um jugo de boi, foi acusado de deserção e atirado dentro de um poço.
Nessa luta para não desanimar, para não perder a sua esperança, Jeremias tomou algumas decisões:
 Ele decidiu se lembrar das misericórdias do Senhor (v.21,22; Filipenses 4.8).
 Ele decidiu se contentar completamente em Deus (v.24; Habacuque 3.17-19).
 Ele decidiu aguardar em silêncio a salvação do Senhor (v.26; Jó 19.25-27).
 Ele decidiu buscar mais a Deus (v.29; Jeremias 29.13; Jeremias 33.3; Mateus 7.7-11).
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No livro de Jó, no capítulo 11, Zofar acusa a Jó de viver em iniquidade e querer transparecer uma pureza que, segundo ele, Jó não teria. E insiste em mostrar que Jó não teria esperança, enquanto não confessasse os seus pecados encobertos.
Zofar errou terrivelmente em sua análise. Nos capítulos 12 e 13, Jó se defende das falsas acusações de Zofar, chegando a exclamar que a sua esperança era tamanha em Deus que ainda que Deus o matasse, ele continuaria esperando nEle (Jó 13.15).
No capítulo 14, Jó discursa, em forma de oração, sobre a brevidade da vida na terra, utilizando-se de várias imagens: a flor que seca, a sombra que foge, o trabalho de um jornaleiro. E, para enfatizar isso, afirma: “Porque há esperança para a árvore, que, se for cortada, ainda se renovará, e não cessarão os seus renovos. Se envelhecer na terra a sua raiz, e morrer o seu tronco no pó, ao cheiro das águas, brotará e dará ramos como a planta” (Jó 14.7-9).
E acrescenta: “Mas, morto o homem, é consumido; sim, rendendo o homem o espírito, então, onde está?” (Jó 14.10).
Jó estava comparando a vida de uma árvore com a vida de um ser humano; comparando aquilo que se vê, a árvore que cortada brota novamente, com aquilo que não se vê, o destino do homem após a morte. Jó estava em desespero, rogando a Deus: renova as minhas forças, restaura a minha esperança; se a simples árvore, ainda que cortada, tem esperança, por que não o ser humano, por que não eu?
A história de Jó continua e somos graciosamente informados que a sua esperança não era vã. Depois de algum tempo, não se sabe quanto, o Senhor se apresenta a Jó, a partir de um redemoinho, e, com isso, o cativeiro de Jó foi mudado, sua vida foi restaurada!
Como já dizia o salmista no Salmo 40, verdadeiramente, quem espera com paciência no Senhor, é por Ele ouvido, e, por fim, restaurado!
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REFERÊNCIAS
ANDRADE, Claudionor Corrêa de. Dicionário Teológico. Rio de Janeiro: CPAD, 1998.
ARRIGTON, F. L. & STRONSTAD, R (editores). Comentário Bíblico Pentecostal: Novo Testamento. v. 2. Rio de Janeiro: CPAD, 2009.
BÍBLIA de Estudo Palavras-Chave: hebraico e grego (ARC). 3. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2012.
BIBLIOTECA Virtual de Saúde. Disponível em <https://bvsms.saude.gov.br/>. Acesso em 14 de dezembro de 2021.
FRIEDRICH Nietzsche. Disponível em <http://www.pensador.com>. Acesso em 14 de dezembro de 2021.
HENRY, Matthew. Comentário Bíblico: edição completa. v.6. Rio de Janeiro: CPAD, 2010.
OXFORD Languages and Google. Disponível em <https://languages.oup.com/google-dictionary-pt/>. Acesso em 14 de dezembro de 2021.
SIQUEIRA, T. M. O conceito de esperança no Antigo Testamento. Disponível em <https://metodista.br/faculdade-de-teologia/materiais-de-apoio/estudos-biblicos/a-esperanca-messianica>. Acesso em 14 de dezembro de 2021.
VINE, W. E, UNGER, M. F, WHTE JR. W. Dicionário VINE: o significado exegético e expositivo das palavras do Antigo e do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2002.
WIERSBE, Warren W. Comentário Bíblico Expositivo. v. 6. Santo André (SP): Geográfica Editora, 2006.